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Como distorcer fatos e influenciar pessoas usando GTA e Counter-Strike

segunda-feira, 11 de abril de 2011
Ronald CS

Não fuja, é simples. Escreva que em GTA e Counter-Strike “acumula mais pontos quem matar mulheres, crianças e idosos”, como fizeram dois jornalistas do jornal O Globo. Assim, com poucas palavras, Antônio Werneck e Sérgio Ramalho distorceram fatos e, provavelmente, influenciaram muitas pessoas. De brinde, ganharam um convite com tudo pago para um churrasco com a equipe e todos os leitores do Kotaku Brasil (local: arena deathmatch data: a definir). Noobs. 

A reportagem, como você suspeita, é sobre Wellington Menezes e as crianças que ele matou na escola do Realengo, no Rio de Janeiro – ou sobre o massacre bizarro, para incorporarmos os sentimentos. Seriam pessoas desinformadas perpetuando essa desinformação com mentiras e falta de apuração quando se fala em jogos eletrônicos? Com certeza, como diz o camarada Pedro Burgos no Gizmodo. Mas talvez seja um pouco mais do que isso. 

Enquanto algumas reportagens mencionavam que Wellington jogava jogos de computador, o máximo de alarmismo que eu havia detectado até então dizia respeito à eterna Veja. Mas ainda estávamos bem – ou eu que não estava lendo o suficiente sobre o caso, perdido nas missões sem graça de Dragon Age II? A sensação, desde quinta-feira, era de que a imprensa tinha evoluído, como disse o Burgos, ou ainda não tinha encontrado nenhuma oportunidade para ligar o atentado aos games. Essa reportagem de O Globo, e seu esforço para incriminar os games, prova que estávamos otimistas demais. 

É muito fácil vender a ideia de “matar inocentes num jogo e ganhar pontos por isso”, distorcendo cerca de 20 anos da história dos games e insultando a inteligência do leitor, e passar ileso. Assim como a noite chega em Minecraft ameaçando tudo o que você conquistou e construiu, as “inverdades” sobre videogame chegam pela grande imprensa (seja no Brasil ou fora dele) uma hora ou outra, trazendo aquela vontade de trocar essa vida de headshots por uma plantação de café ou uma mina de carvão para o resto da vida. Viver de verdade, voltar para a enxada, desconectar a Live, enfim. 

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Mas, ok. Penso que já superamos essa ignorância alheia a ponto de não precisarmos mais ficar rebatendo os argumentos perspicazes que eles insistem em repetir. Uma jornalista especializada na cobertura de política, certa vez, ao saber que eu era “jornalista de games”, saiu-se com um comentário profundamente criativo, deveras perspicaz e definitivamente inédito na TV brasileira: “Aaaaaaah, então você fica jogando joguinho o dia inteiro, que vida boa kakakakak rsrsrsrsrsrsrs me add LoL”. Minha resposta foi um “Ah, então você fica desviando verbas públicas o dia inteiro”. Talvez não tenha sido a atitude mais cortês, mas foi minha primeira (e única) vitória em um “quick time event” na vida real, então vamos valorizar. 

Houve casos em que a “piadinha” se transformou em conflito real na redação de um grande meio de comunicação? Houve. Mas isso será abordado em um conteúdo extra via download ainda sem data anunciada. 

Até porque vamos ficar cansados, já que a patrulha nunca vai parar de jogar os games na fogueira, e ainda temos que terminar Crysis 2 porque Portal 2 e L.A. Noire estão logo ali. Essa patrulha é dos pais que se sentem ameaçados, do jornalista que precisa de um título forte, das religiões? Se eles mentem e distorcem os fatos em campos tão diversos como os da psicologia, educação e segurança, por que deveriam poupar os games? Se interpretam livremente o conceito de “porte de armas”, que é algo regido por lei, por que vão se preocupar com a precisão das informações quando falam de “joguinhos”? 

Desde que aconteceu o tiroteio na escola, tivemos apresentadores, especialistas, jornalistas e autoridades estuprando os fatos e os “termos técnicos” em pelo menos quatro campos diferentes, nas mais diferentes posições e linhas editoriais. Da psicologia à educação, da segurança pública à noção de vida real, da balística até, é claro, os games. Como bem lembrou o comparsa Erik Gustavo no Twitter, havia “começado mais cedo o Jornal Tirando Conclusões Precipitadas”. 

Em questão de segundos já tinham sido divulgados dezenas de perfis psicológicos do assassino, listas de culpados na história e conjuntos de soluções infalíveis. Que, parece, estão mudando a cada nova prova descoberta. Um dos revólveres calibre .38 virou .32? Uma amenidade, você diz, mas não deixa de ser uma informação básica, simples e evidente, divulgada de forma incorreta. A culpa era do bullying, a culpa era do Estado, a culpa era da mídia, a culpa era dos games. A solução, na manhã seguinte ao massacre, era tornar o porte de armas mais rigoroso. Mas o que é porte de armas? Quem tem porte de armas? Onde eu compro um “speed loader” em GTA? Onde estão as velhinhas em Counter-Strike? Não questione, siga o GPS e seja feliz.

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